quinta-feira, 22 de maio de 2014

Resenha: No lugar de meu pai, eu - Felipe Belão

                E acaba-se a história de Tito Tassus. Ao menos por enquanto.
                Dentre os três livros da trilogia, “No lugar de meu pai, eu” foi o meu favorito. Assim como no primeiro livro, Belão usa da narrativa de maneira linear. E diferente do primeiro livro, este toca você em uma profundidade nova.
                O avô de Tito morreu. A idade o alcançou e o patriarca da família Tassus se foi. O livro começa nos mostrando Tito resolvendo o que se deve resolver para que o velório e o enterro possam acontecer. Complicações legais e blábláblá. Tudo aquilo do qual não precisamos no momento em que alguém próximo – no caso, o herói de Tito, presente desde Vitrine de Sonhos – se vai. Lembro de Felipe, o autor, me falando que eu gostaria bastante do final do livro, pois ele havia adorado escrevê-lo. Eu não vou tirar crédito algum disso, o final é com toda a certeza muito bom. Mas não tem como eu ter gostado mais dele do que do velório. Ao menos da maneira mais respeitosa da qual se pode gostar de um velório. Mas já chego lá, calma.
Destaque pra essa capa linda, feita por Marcos Santiago Delacoletta
                O livro nos conduz pelo luto de Tito, o modo como o já-não-tão-garoto enfrenta a perda de seu herói, cheio de tristeza e melancolia. É só sobre isso que o livro fala até a metade dele. Sério, exatamente metade. E é incrível a fidelidade que essa metade do livro tem para com os sentimentos de alguém que perdeu uma pessoa especial. Incrível.
                A outra metade nos fala de três outras coisas.
                A primeira, ainda focada no luto pela perda do avô, fala sobre a superação da perda. O seguir em frente. A segunda nos fala sobre o tal pai. O pai de Tito. É bonito. Tocante, sim. E a terceira, nas últimas cinco páginas, nos revela o que qualquer um que prestou alguma atenção no livro sabe. Mas bons livros nos contam aquilo que já sabemos, não é, Winston?
                Eu tenho que falar agora, com mais detalhes, sobre o primeiro capítulo. Você pode pular para o final da resenha se quiser, eu vou falar um pouquinho de mim mesmo agora. Mas eu recomendo que leia.
                Quando eu tinha dez anos de idade meu pai morreu. Não é segredo pra ninguém que me conhece um pouquinho. E na verdade, depois de dez anos sem ele, isso não me incomoda. Incomodou muito pouco desde que aconteceu, na verdade. A maior parte da minha vida eu passei sem meu pai.
                Depois que meu pai morreu eu virei uma pedra com a morte. Eu e minha irmã. No velório, nenhum de nós derramou lágrima. Meu irmão também não, mas ele era jovem demais pra entender bem o que acontecia. Eu e minha irmã tomamos... Ahn... Gosto pelo mórbido. Se vocês leram o que eu escrevi em contos e livros, sabem disso. Se leram e não sabem, agora devem ter ligado os pontos. Se machuque na minha frente e eu vou te ajudar, vou me preocupar. Só tente não morrer na minha frente. Nesse ponto eu já deixei de ligar. E evite morrer na frente da minha irmã. Ela é pior do que eu. Ela vai te dar um tapa. Ela tem vontade de dar um tapa em alguém morto pra saber o que acontece.
                A morte do meu pai mudou drasticamente a maneira como vejo a vida em si. E permitiu que a cada velório que eu presenciei, eu pudesse observar de perto coisas que a tristeza costuma encobrir.
                Eu vi a tristeza rasgar corações em velórios. Vi cheiro de morte contaminar as pessoas e me cumprimentar no caminho. E eu vi o quão isso é triste. Mas já dizia uma música que gosta de grudar na cabeça até ficar irritante, quanto mais triste mais bonito soa. Velórios têm muita beleza. É só saber enxergar. E foi esse tipo de beleza – a beleza triste, a beleza das lágrimas, a beleza que só um anjo pode mostrar. Nem que seja o anjo da morte – que o primeiro capítulo desse livro me mostrou. A despedida de um grande homem e como sua falta se fez nas pessoas que viviam ao seu redor. Eu pude sentir a morte nesse livro, “apenas” pela descrição do velório. Eu pude entender como alguém se sente quando o cheiro de morte o envolve ao invés de acenar ao longe. E isso é uma experiência que eu não acho que eu vá ter tão cedo. Eu agradeço ao Felipe por isso.
                Mas a vida continua – eu sei bem disso – e as coisas acontecem. Oportunidades surgem, chances aparecem, escolhas são feitas. E nós temos de arcar com tudo que elas nos trazem. Todos os desprazeres e prazeres que as escolhas nos dá. É assim que se vive. Não tem tanto mistério. Ao menos na teoria. Há algum tempo eu não coloco uma citação de livros resenhados, mas aqui vai uma que merece destaque.
                “[...] Tomo o lugar do meu Herói e do meu pai. Sou homem e não apenas filho. Sou agora pai e Herói do filho que ainda não nasceu. Mundão velho, me receba. Mundão novo, nós te criaremos.

Páginas: 126
Editora: InVerso

CDD: B869.35 (Eu não achei o ISBN no livro, pessoas. Poxa, eu gosto tanto do ISBN).

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